Era um dia típico em Manaus. Estava quente. O sol queimava a pele de quem andava descalço pelo asfalto da comunidade São Pedro, antiga Carbrás.Na esquina, num bar, um grupo de rapazes, distraía-se tomando uma birita enquanto jogavam conversa fora. Paro e peço uma coca. De repente, as vozes e as risadas que dominam o badalado botequim somem e dão espaço para o som das motocicletas e alguns carros que por ali passam deixando rastros de poeira no ar.
Eram três horas da tarde de uma terça-feira. Eu estava sedenta, e o refrigerante gelado.Mas o burburinho continuou, e o que era antes um bate-papo descontraído, transformou-se em um diálogo monossilábico : - É?!, não?!, pois é.., será? Sei não mano?!.Percebi então, que a presença de alguém nunca antes visto nas redondezas de uma comunidade onde comumente todos se conhecem – por contato diário ou por conversas de porta – poderia ser o fator causador desse clima estranho e infreqüente.
Foi então, que me dirigi ao grupo e perguntei: Vocês sabem onde fica a escola da comunidade São Pedro? Um deles, um tanto desconfiado respondeu: - A senhora segue direto essa mesma rua aqui e vai tá lá, a escola. Eu agradeci e enquanto seguia pelo caminho que me fora sugerido, pensava porque toda aquela estranheza, me lembrava das aulas de filosofia, a caverna de Platão, a ignorância, o sol – como ardia – a luz e a sabedoria. Pode parecer gozado, mas a explicação é simples: estranhamos o que ignoramos. E é assim com todo mundo, independente de cor, religião ou posição social, sempre que nos deparamos com algo inusual, surpreendemo-nos em função do desconhecido. Eu era “o estranho”naquele lugar “desconhecido”.
Foi fácil encontrar a escola que leva o nome de um dos ícones amazonenses da luta pelos direitos humanos: Nestor José Soeiro do Nascimento, e que instaurou-se como marco no resgate da cidadania das pessoas que ali vivem, pois na inauguração, o então prefeito Serafim Corrêa assinou o documento que desapropriou o terreno, o qual pertencia ao ex-prefeito de Parintins, Carlinhos da Cabrás,- devedor de mais de quatro milhões e meio de reais referente ao IPTU e que por isso deu-se à legalização da invasão, a qual se tornou Comunidade do Parque São Pedro.
No final de tarde, cansada, depois de ter observado as crianças alegres brincando no intervalo da aula de “barra-bandeira”, “amarelinha”, depois de ter visto duas senhoras nas varandas de suas casas tecendo algo que suponho ser um cesto de náilon, depois de ter conversado com moradores que passeavam pelas ruas em direção ao ponto de ônibus, depois de ter ficado surpresa com a quantidade de lojas de confecções, calçados, mercadinhos, mercearias que se alastram pelas ruas da comunidade, depois de alguns contatos, um pouco mais de familiarização com o ambiente, andava pelas ruas livremente como se fosse habitual, me sentindo parte do ritmo que ali se leva. E passando outra vez pelo tal barzinho, duas crianças numa bicicleta gritaram: Tchau moçaa!! Eu sorri e acenei, pensando que o que nos falta é a experiência, o convívio, o conhecimento para quebrar esse abismo que há entre o familiar e o desconhecido.
Tainá Lima
quarta-feira, 28 de outubro de 2009
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2 comentários:
Óh que lindo, moça!
:*
Ah...estou sedento de vontade de visitar o badalado botequim com a senhorita! ;)
Espero que não nos barrem na porta D:
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