Dois horizontes fecham nossa vida:          
Um horizonte, — a saudade          
Do que não há de voltar;          
Outro horizonte, — a esperança          
Dos tempos que hão de chegar;          
No presente, — sempre escuro,—          
Vive a alma ambiciosa          
Na ilusão voluptuosa          
Do passado e do futuro.
         
Os doces brincos da infância          
Sob as asas maternais,          
O vôo das andorinhas,          
A onda viva e os rosais;          
O gozo do amor, sonhado          
Num olhar profundo e ardente,          
Tal é na hora presente          
O horizonte do passado.
          
Ou ambição de grandeza          
Que no espírito calou,          
Desejo de amor sincero          
Que o coração não gozou;          
Ou um viver calmo e puro          
À alma convalescente,          
Tal é na hora presente          
O horizonte do futuro.
          
No breve correr dos dias          
Sob o azul do céu, — tais são          
Limites no mar da vida:          
Saudade ou aspiração;          
Ao nosso espírito ardente,          
Na avidez do bem sonhado,         
 Nunca o presente é passado,          
Nunca o futuro é presente.
          
Que cismas, homem? – Perdido          
No mar das recordações,          
Escuto um eco sentido          
Das passadas ilusões.          
Que buscas, homem? – Procuro,          
Através da imensidade,          
Ler a doce realidade          
Das ilusões do futuro.                    
Dois horizontes fecham nossa vida.
Machado de Assis, in 'Crisálidas'
domingo, 27 de dezembro de 2009
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